Em cima dos viventes fatigados
Morfeu as dormideiras espremia:
Os mentirosos sonhos me cercavam;
Na vaga fantasia
Ao vivo me pintavam
As glórias, que desperto,
Meu coração pedia.
Eu vou, eu vou subindo a nau possante,
Nos braços conduzindo a minha bela;
Volteia a grande roda, e a grossa amarra
Se enleia em torno dela;
Já ponho a proa à barra,
Já cai ao som do apito
Ora uma, ora outra vela.
Os arvoredos já se não distinguem:
A longa praia ao longe não branqueja;
E já se vão sumindo os altos montes,
Já não há que se veja
Nos claros horizontes,
Que não sejam vapores,
Que Céu, e mar não seja.
Parece vão correndo as negras águas,
E o pinho qual rochedo estar parado;
Ergue-se a onda, vem à nau direita,
E quebra no costado;
O navio se deita,
E ela finge a ladeira
Saindo do outro lado.
Vejo nadarem os brilhantes peixes,
Cair do lais a linha que os engana;
Um dourado no anzol está pendente,
Sofre morte tirana,
Entretanto que a sente,
Ao tombadilho açoita
A cauda, e a barbatana.
Sobre as ondas descubro uma carroça
De formosas conchinhas enfeitada;
Delfins a movem, e vem Tétis nela;
Na popa está parada;
Nem pode a Deusa bela
Tirar os brandos olhos
Na minha doce amada.
Nas costas dos golfinhos vêm montados
Os nus Tritões, deixando a esfera cheia
Com o rouco som dos búzios retorcidos.
Recreia, sim, recreia
Meus atentos ouvidos
O canto sonoroso
Da música sereia.
Já sobe ao grande mastro o bom gajeiro;
Descobre arrumação, e grita – terra!
À murada caminha alegre a gente;
Alguns entendem que erra;
Pelo imóvel somente
Conheço não ser nuvem,
Sim o cume d’alta serra.
De Mafra já descubro as grandes torres;
(E que nova alegria me arrebata!)
De Cascais a muleta já vem perto,
Já de abordar-nos trata;
Já o piloto esperto,
Inda debaixo manda
Soltar mezena, e gata.
Eu vou entrando na espaçosa barra,
A grossa artilharia já me atroa;
Lá ficam Paço d’Arcos, e a Junqueira;
Já corre pela proa
Uma amarra ligeira;
E a nau já fica surta
Diante da grã Lisboa.
Agora, agora sim, agora espero
Renovar da amizade antigos laços;
Eu vejo ao velho pai, que lentamente
Arrasta a mim os passos;
Ah! com vem contente!
De longe mal me avista,
Já vem abrindo os braços.
Dobro os joelhos, pelos pés o aperto;
E manda que dos pés ao peito passe;
Marília, quanto eu fiz, fazer intenta;
Antes que os pés lhe abrace
Nos braços a sustenta;
Dá-lhe de filha o nome,
Beija-lhe a branca face.
Vou descer a escada, oh Céus, acordo!
Conheço não estar no claro Tejo;
Abro os olhos, procuro a minha amada,
E nem sequer a vejo.
Venha a hora afortunada,
Em que não fique em sonho
Tão ardente desejo!
_________________________________________________________
INTERPRETAÇÃO:
Nesta Lira, Dirceu já não está mais no Brasil, e tem muitas saudades de sua amada. Ele começa falando que está em um navio, regressando a sua terra natal, Portugal. Não se consegue ver mais as prais brancas, nem os montes, só o vapor, a água e o céu. O autor consegue ver criaturas mitológicas, como Tritões e Sereis, fala sobre os peixes brilhantes, que ao caírem na linha, sofrem morte tirana, ao retirarem sua cauda e sua barbatana. Na sétima estrofe, ele diz que ouve o som da buzina, e o gajeiro gritar - Terra!, então consegue ver o cume da montanha, e as grandes torres, e fica muito feliz por estar de volta a Lisboa, pois espera renovar suas amizades antigas. De longe vê seu pai, que lentamente vêm ao seu encontro com braços abertos. Dirceu se ajoelha, e abraça seus pés. Encontra com sua amada, a abraça e diz que quer lhe dar uma filha, e a beija. Mas de repente ele acorda, e percebe que tudo não passou de um sonho, que sua amada não está com ele.
CARACTERÍSTICAS DO ARCADISMO:
- Uso da Mitologia: Quando ele fala dos Tritões e das Sereias.
SITUAÇÃO HISTÓRICA:
Não se sabe ao certo o que estava acontecendo no momento que está lira foi escrita, mas acredito que foi quando ele fora deportado para Moçambique por ser acusado de ser um dos supostos líderes da Inconfidência Mineira.
GLOSSÁRIO:
Fatigados : Cansados.
Nau: Antiga embarcação a vela, de alto bordo, com três mastros e numerosas bocas de fogo.
Volteia: Girar.
Enleia: Prender.
Arvoredos: A mastreação do navio.
Branqueja: Apresentar a cor branca.
Costado: Conjunto de chapas ou pranchas que revestem o cavername de um navio.
Tombadilho: A parte mais alta de um navio, que vai do mastro da mezena até a popa.
Açoita: Devasta.
Tritões: Divindade marítima, de ordem inferior.
Búzios: Buzina.
Gajeiro: O marinheiro encarregado de de vigiar no cesto da gávea as embarcações ou a terra.
Cume: A parte mais elevada da montanha.
Mezena: Vela que se enverga na carangueja do mastro de ré em tempo ruim.
Myllena Marques.
Número: 28.
1º C.
Gostei e concordo com a sua interpretação. Ficou muito boa.
ResponderExcluirMarcos Vinícius nº 23
1C
Entendi pela lira que foi quando ele tinha sido reportado, e o sonho que ele teve, era com certeza o que ele queria que estivesse acontecendo.
ResponderExcluirMatheus Souza Feitosa N:26
1C